VOZES DA TRADUÇÃO, ÉTICAS DO TRADUZIR

II Simpósio Nacional do Grupo de Pesquisa MultiTrad

Abordagens Multidisciplinares da Tradução

12 a 14 de dezembro de 2012 – UFPR, Curitiba

 

PROGRAMAÇÃO GERAL                                            

 

12 de dezembro

17h00 – 18h45

TRADUÇÃO, ÉTICA E POLÍTICA

Maria Clara Castellões de Oliveira (UFJF)

Maria Angélica Deângeli (UNESP-S.J. do Rio Preto)

Paulo Sampaio Xavier de Oliveira (Unicamp)

18h45 – 19h00

intervalo

19h00 – 20h15

TRADUÇÃO COMO DIÁSPORA E ABISMO:

VOZES NA DIFERENÇA

Lauro Maia Amorim (UNESP – S. J. do Rio Preto)

Marcelo Paiva de Souza (UFPR)

  

13 de dezembro

08h30 – 10h15

AS MUITAS VOZES NA HISTÓRIA DA TRADUÇÃO BRASILEIRA

Cristina Carneiro Rodrigues (UNESP-S.J. do R. Preto)

Paula Godoi Arbex (UFU)

10h15 – 10h30

intervalo

10h30 – 11h45

TRADUÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA

Cristina de Amorim Machado (UEM)

Érika N. de A. Stupiello (UNESP-S.J. do Rio Preto)

12h00 – 14h00

almoço

14h00 – 16h00

COMUNICAÇÔES

Teresa Dias Carneiro (PUC-Rio)

Daniel Martineschen (UFPR)

Simone Petry (Unicamp)

Letícia Della G. de França (UFPR)

Luciano Ramos Mendes (UFPR)

Yuri Kulisky (UFPR)

16h00 – 16h15

intervalo

16h15 – 17h30

TRADUTOR E TRADUÇÃO:

CONSTRUÇÕES IDEOLÓGICO-DISCURSIVAS

Lenita Rimoli Esteves (USP)

Giovana C. C. de Melo (UFRJ) e Beatriz Caldas (UERJ)

 

14 de dezembro

08h30 – 09h45

SUJEITO DO DESEJO E TRADUÇÃO

Maria Viviane do Amaral Veras (Unicamp)

Márcia Atálla Pietroluongo (UFRJ)

09h45 – 10h15

intervalo

10h15 – 11h30

TRADUÇÃO, SILÊNCIO E ALTERIDADE

Helena Franco Martins (PUC-Rio)

Mauricio Mendonça Cardozo (UFPR)

  

Local:

 Universidade Federal do Paraná – Curitiba

Rua General Carneiro, 460

Edifício D. Pedro I – Anfiteatro 300

 

Atenção: o acesso ao auditório se dá pela biblioteca, no segundo andar. Uma vez esgotados os escaninhos, não será permitida a entrada com bolsa!

 

Promoção e Organização:

 Programa de Pós-graduação em Letras da UFPR

Laboratório de Teoria e Crítica de Tradução Literária da UFPR

Grupo de Pesquisa MultiTrad

 

RESUMO DOS TRABALHOS

  

12 de dezembro

 

TRADUÇÃO, ÉTICA E POLÍTICA

 

Tradução, memória e silêncio: considerações políticas e éticas acerca das literaturas magrebinas de expressão francesa

Maria Angélica Deângeli (UNESP – São José do Rio Preto)

 

Em seu livro La République Mondiale des Lettres (1999/2008), Pascale Casanova afirma que: “Todos os ‘escritores literários’ das ‘pequenas’ línguas são confrontados, de uma forma ou de outra, à questão, de alguma maneira inevitável, da tradução. ‘Escritores traduzidos’, eles são tomados por uma contradição estrutural dramática que os obriga a escolher entre a tradução numa língua literária, a qual os separa de seu público nacional, mas lhes oferece uma existência literária, ou o recolhimento numa ‘pequena’ língua, a qual os condena à invisibilidade literária ou a uma existência literária completamente reduzida à vida literária nacional” (2008, p. 363). Se por um lado, a afirmação de Casanova merece ser questionada, por outro, essa mesma afirmação encontra ressonâncias diretas no debate que animou (e ainda anima) grande parte da produção literária pós-colonial do Magrebe. A interrogação sobre o estatuto da língua na qual se escreve é, de fato, um imperativo para o escritor dividido entre a herança da língua do colonizador e a diversidade dos múltiplos idiomas locais. Escrever nesse contexto é, de acordo com Casanova, travar um enfrentamento direto com a questão da língua. Neste sentido, escrever é entregar-se à aventura de um entre-as-línguas que se define como um desafio político-identitário constitutivo de toda tradução. O objetivo desta comunicação é o de investigar, a partir de uma visada teórica e analítica, compreendendo os escritos de Pascale Casanova (2008), de Jacques Derrida (1998; 1999) e de Jean-Luc Nancy (2000), como, nas obras de autores magrebinos de expressão francesa, a escrita é, antes de tudo, concebida como um ato de tradução entre-as-línguas e as culturas. Mais especificamente, tencionamos analisar no texto La Mémoire Tatouée: Autobiographie d’un Décolonisé (1971), do escritor marroquino Abdelkebir Khatibi, como, por meio de uma retórica teórico-ficcional, que seria também uma retórica confessional, o autor coloca em prática o exercício de uma ética que, ligando o segredo ao sacrifício, a literatura ao político, a escritura à tradução, não cessa de se dizer apesar dos rastros de seu silêncio.

 

A tradução da letra, a ética do para o outro e a formação de tradutores

Maria Clara Castellões de Oliveira (UFJF)

 

Este trabalho articula o pensamento de filósofos como Emmanuel Lévinas, Jacques Derrida e Hannah Arendt a fim de fazer uma apologia da tradução da letra no contexto da literatura. Ele parte do princípio de que a tradução e o tradutor, ao colocarem o Outro em relação com o Mesmo, não devem perder de vista que, antes de estarem comprometidos com a lógica de mercado (que, via de regra, espera que o Outro seja subsumido pelo Mesmo), eles se encontram comprometidos com a essência da experiência tradutória, na qual a estranheza do Outro deve resistir a ser reduzida aos valores do Mesmo. A despeito de assumir o caráter relacional e transformador inerente a toda atividade de tradução, este trabalho defende a postura de que o formador de tradutores deve nortear seu discurso por uma ética do para o outro, que, de certa forma, poderia ser nomeada de uma ética do por vir, uma vez que a medida da relação e da transformação envolve a mediação de vozes frequentemente dissonantes e assimétricas.

 

Qual ética?

Paulo OLIVEIRA (Unicamp)

 

Na história do pensamento, nos deparamos não apenas com diferentes sistemas de ética, como também, num outro nível, com as diferentes naturezas desses sistemas. Compreender o que há de comum ou diverso entre eles pode ser de fundamental importância para uma aplicação produtiva do conceito nos mais variados campos como, em nosso caso, os estudos e a prática da tradução, a formação de tradutores etc. Se distinguirmos, por exemplo, sistemas de base deontológica (foco nos valores a priori) daqueles de caráter finalístico (focados nas consequências do nosso agir), identificaremos semelhanças notáveis onde aparentemente reina a diferença, como, dentre outros, no cotejo das propostas de Haroldo de Campos (1970, 1981) com as de Antoine Berman (1984, 1995) ou Lawrence Venuti (1995, 1998) – no tocante às estratégias de apropriação ou estrangeirização. Para além da vigência desses sistemas e dos limites de sua aplicabilidade, coloca-se a questão das decisões do tradutor quando se depara com problemas sem solução previamente dada, seja por tratarem-se de questões não previstas nos sistemas ou por terem sua origem no conflito entre mais de um deles – daí a “ética em primeira pessoa” de Ludwig Wittgenstein. Deve/pode o tradutor colocar-se em relevo na obra traduzida? Quais os limites de sua visibilidade num contexto cultural que privilegia as estratégias de fluência? Estará o tradutor inexoravelmente condenado ao gesto que Mathias Kroß (2012) chamou de “figura paradoxal” de seu “auto-apagamento”? Até que ponto é possível superar o fato de que o leitor, como argumenta Celso Cruz (2012), vê no texto traduzido não só o pensamento, mas também as marcas estilísticas “do autor”, não se importando com essas questões no tocante ao tradutor? Sugiro que convém distinguir os diferentes momentos e campos de aplicação dos conceitos: mesmo no reino dos tradutores “invisíveis” (exigidos pelo mercado?), não convém ao tradutor (em formação?) acreditar nesse mito, se quiser cumprir bem seu papel, compreendendo-o de forma adequada.

 

Tradução como Diáspora e Abismo: Vozes na Diferença

 

Tradução como diáspora: as vozes da poesia afro-americana no Brasil

Lauro Maia Amorim (UNESP – São José do Rio Preto)

 

Este trabalho tem por objetivo discutir o papel da tradução na divulgação da literatura afro-americana no Brasil, com foco especial nas antologias de língua inglesa contendo trabalhos de poetas afro-americanos. A tradução de poemas da literatura afro-americana representa um evento semelhante à diáspora representada pela disseminação das culturas e povos migrantes afrodescendentes pelo globo, na medida em que tanto as traduções dos poemas quanto os povos transculturados não repetem simplesmente o “original”, seja ele o texto de partida da tradução ou as culturas pátrias das quais esses povos são oriundos. Ao contrário, a tradução cultural se dá pela “repetição” na diferença, em um processo de hibridismo que Paul Gilroy denomina de “the changing same” ou o “mesmo mutante”. Analisa-se em que medida os tradutores brasileiros de diferentes antologias (bem como seus editores) produziram traduções que refletem perspectivas domésticas na construção do estrangeiro, especialmente no que diz respeito à questão da representação da problemática “racial” no texto traduzido. Discute-se em que medida a noção de mestiçagem se faz presente como uma forma de percepção subjacente à intepretação da diferença do Outro no Brasil, a qual se dá por meio da tradução cultural, e avalia-se a relação entre “assimilação” da alteridade e a construção de uma dicção poética menos “racialmente” motivada.

 

Luzeiro e sol: El príncipe constante, de Calderón de la Barca, e Książę niezłomny, de Juliusz Słowacki

Marcelo Paiva de Souza (UFPR)

 

Tomando como pano de fundo as grandes vertentes da pesquisa que se dedicou no séc. XX ao teatro de Pedro Calderón de la Barca, submete-se a exame Książę niezłomny, versão polonesa de El príncipe constante da lavra do poeta e dramaturgo romântico Juliusz Słowacki. Como a tradução słowackiana (publicada pela primeira vez em Paris, em 1844) tornou-se ela mesma um clássico do acervo literário polonês, além de ter servido de base, entre outros, ao célebre espetáculo homônimo do Teatro Laboratório de Jerzy Grotowski (a encenação estreia na cidade de Wrocław, em 1965), intenta-se auscultar a complexa trama de vozes criativas que se urdiram no caso e acenar ao largo horizonte de indagação crítica a partir dele descortinado.  

 

13 de dezembro

 

AS MUITAS VOZES NA HISTÓRIA DA TRADUÇÃO BRASILEIRA

 

As muitas vozes de Viagem ao Brasil em traduções intermediárias

Cristina Carneiro Rodrigues (UNESP – S. J. do Rio Preto)

 

Neste trabalho vou discutir, a partir do livro Viagem ao Brasil, questões éticas de reaproveitamento de traduções anteriormente publicadas, de autoria e de tradução intermediária. Consta, nas referências, que A Journey in Brazil é de autoria de Louis e Elizabeth Agassiz, mas trata-se do diário de viagem da esposa do naturalista, pontuado por notas, conferências e cartas do pesquisador. O livro foi traduzido para o francês por Félix Vogeli em 1869, dois anos após o lançamento da primeira edição em inglês. Essa edição francesa foi traduzida e anotada por Edgar Süssekind de Mendonça e publicada na coleção Brasiliana em 1938. Em 1975 o título foi lançado pela coleção

Coleção Reconquista do Brasil, com tradução de João Etienne Filho, constando que o texto de partida seria também a edição francesa. Análise dessa tradução evidencia que é muito próxima à do primeiro tradutor, parecendo uma reescrita do trabalho de Mendonça, mas sem suas notas e com notas do editor da coleção. Os volumes publicados nas duas coleções conservam as notas do tradutor francês. Viagem ao Brasil

configura-se, portanto, como um texto em que muitas vozes se fazem ouvir e que suscita discussão de várias questões éticas.

 

A tradução em múltiplas vozes: traduções e pseudotraduções na Revista do Globo

Paula Arbex (UFU)

 

Textos literários traduzidos ocupam boa parte das páginas da Revista do Globo, periódico editado pela Livraria do Globo entre os anos de 1929 e 1967. São diversas as identidades presentes nessas traduções, realizadas (e assinadas) por escritores consagrados, por tradutores desconhecidos, e mesmo por tradutores fictícios, como no caso das pseudotraduções, ao lado de um sem-número de traduções apócrifas. A partir do vasto corpus constituído pela edição digitalizada dos 942 fascículos da Revista do Globo, o presente trabalho pretende mapear, a partir de diferentes recortes, as múltiplas vozes encontradas em suas traduções, bem como discutir as estratégias tradutórias de seus agentes.

 

TRADUÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA

 

As vozes ruidosas das traduções modernas do Tetrabiblos de Ptolomeu

Cristina de Amorim Machado (UEM)

 

Este trabalho pretende apresentar três questões que se produziram durante a tradução dos capítulos teóricos do Tetrabiblos – tratado de astrologia escrito por Claudio Ptolomeu na Alexandria do século II –, feita pela primeira vez diretamente do grego para o português por Marcus Reis Pinheiro (UFF) e por mim ao longo dos últimos cinco anos. As três dizem respeito ao ruído das traduções modernas da obra astrológica de Ptolomeu. Esse abundante vozerio das edições de que dispomos hoje em diversas línguas nos auxiliou deveras na empreitada, mas também nos obrigou a um esforço bem maior do que se poderia supor. A primeira questão é que essa experiência demandou um estudo contínuo e sistemático da astrologia de Ptolomeu em diálogo com suas outras obras e também com seus contemporâneos. A segunda questão é que, durante o processo, percebemos que o Tetrabiblos foi deixando de ser uma fonte de significados seguros a traduzir, e passamos a interagir com o texto, a dialogar com Ptolomeu, seus tradutores e comentadores, a gerar uma prática tradutória criadora que não pretendia mais reproduzi-lo, e sim fabricar um híbrido, o nosso Tetrabiblos de Ptolomeu. A terceira questão diz respeito às nossas próprias concepções de tradução, ciência e história, que, nesse caso, foram decisivas na hora de escolher esta ou aquela tradução, já que conceitos científicos mudam ao longo da história, objetos científicos surgem e desaparecem, e até mesmo tradições científicas inteiras podem deixar de ser consideradas como tais, como foi o caso da astrologia. Todas essas questões foram tratadas durante a tradução por meio de longas discussões, extensas notas explicativas e pela organização de um glossário. Para explicitar tudo isso, contarei um pouco da história dessa tradução e apresentarei algumas passagens que ilustram a difícil e enriquecedora tarefa de, nos dias de hoje, fazer uma tradução de Ptolomeu, ou melhor, com Ptolomeu, sobretudo diante do ruído causado pela fartura de vozes da tradução que ecoaram no tempo e sussurraram nos nossos ouvidos.

 

A autoria tradutória em jogo: possíveis desdobramentos éticos da prática de compartilhamento de sistemas de memórias de tradução

Érika Nogueira de Andrade Stupiello (UNESP – São José do Rio Preto)

 

A disseminação do emprego de sistemas de memórias em trabalhos de tradução de textos em formato eletrônico tem contribuído para tornar ainda mais escassos os prazos para entrega do trabalho final. A ordem mercadológica atual que dita o ritmo de produção de traduções é guiada especialmente pelos recursos de armazenamento de dados disponíveis nos sistemas de memória, que tornam possível o aproveitamento de trechos de trabalhos anteriores em novas produções. Por não existir uma regulamentação sobre a autoria do trabalho fragmentado e armazenado em bancos de dados dos sistemas de memórias, tanto tradutores como clientes sentem-se igualmente no direito de decidir sobre como será empregado o resultado da pesquisa terminológica do tradutor. Este trabalho examina alguns desdobramentos de caráter ético em práticas envolvendo o compartilhamento de memórias entre tradutores e seu uso difundido em trabalhos posteriores por clientes que presumem ter direito à posse incondicional da pesquisa terminológica do tradutor na entrega da tradução contratada.

 

BLOCO DE COMUNICAÇÕES DOS ESTUDANTES

 

Prefácio do tradutor: um gênero textual?

Teresa Dias Carneiro (Doutoranda em Estudos da Linguagem – PUC-Rio), orientadora: Marcia do Amaral Peixoto Martins

 

As indagações que apresentarei fazem parte de um projeto de pesquisa mais amplo com vistas à redação da minha tese de Doutorado, cujo título preliminar é: Contribuições para uma teoria do paratexto do livro traduzido: caso das traduções de obras literárias francesas no Brasil a partir de meados do século XX. A pesquisa que vem servindo de base para a análise foi realizada na Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro, e em acervo próprio, constituindo um corpus de cerca de 350 livros, sendo alguns do mesmo título, traduzidos por tradutores diferentes em épocas diversas. Já ao término da fase da pesquisa na Biblioteca Nacional, uma constatação se fez presente: os prefácios/posfácios lidos tinham características em comum e apresentavam regularidades. Logo então surgiu a indagação de se o prefácio do tradutor não poderia constituir um gênero textual/discursivo, ou pelo menos um subgênero dentro da categoria mais ampla de prefácios. Ficou clara desde então a necessidade do amparo na teoria dos gêneros textuais/discursivos, a fim de trazer elementos que pudessem lançar luz a essa questão, sem a pretensão, contudo, de fazer um trabalho específico na área dos gêneros, mas tão somente de introduzir algumas das questões e discussões da teoria dos gêneros à teoria do paratexto do livro traduzido. John Swales (1990), um dos principais teóricos dos estudos de gênero, de viés sociorretórico, desenvolveu o modelo CARS (create a research space). Apesar de Swales nortear sua abordagem da observação dos gêneros para o ensino de produção de textos, o seu modelo de análise serve perfeitamente para aplicação em pesquisas. Swales, então elaborou esse modelo, definindo movimentos e passos, para facilitar a detecção de recorrências em textos de mesmo tipo/gênero. Fazendo adaptações do modelo original de Swales com o objetivo de dar contribuições para a teoria do paratexto do livro traduzido, e especificamente para a análise de prefácios/posfácios de tradutores, apresentarei e analisarei na comunicação do II Seminário do Grupo MultiTrad dois prefácios de tradutores (Ferreira Gullar, em Cyrano de Bergerac, de Edmond Rostand, José Olympio, 2011; e André Telles e Rodrigo Lacerda, em O conde de Monte Cristo, de Alexandre Dumas, Zahar, 2012), visando a chegar a algumas conclusões preliminares.

 

Tradução, alteridade e Weltliteratur na obra de Johann Gottfried von Herder

Daniel Martineschen (Doutorando em Letras: Estudos da Tradução – UFPR/REUNI), orientador: Mauricio Mendonça Cardozo

 

Partindo de um recorte da obra de Johann Gottfried von Herder (1744-1803)  representativo de sua reflexão sobre a tradução, propomos uma leitura desse recorte em  uma chave relacional e apresentamos um panorama dessa reflexão tendo em vista sobretudo explicitar o entendimento de alteridade que a caracteriza. Esse recorte foi levantado a partir da edição das obras completas organizada por Ulrich Gaier em 1985 e  com o apoio de textos críticos sobre o autor (sobretudo a tese de doutoramento de Andreas Kelletat), e compreende textos concentrados principalmente nas décadas de 1770 e 1780. A reflexão herderiana sobre a tradução sempre esteve ligada a questões

relativas à literatura, sobretudo quanto à influência que a literatura estrangeira poderia ter para a formação da língua, da cultura e da literatura alemãs. Ainda bastante influenciado pelo classicismo setecentista, Herder primeiramente considerava a tradução um meio limitado e deformador do acesso a outras literaturas, em especial a greco-romana. Após sua viagem de formação de 1769, nota-se um ponto de inflexão a partir do qual a tradução passa a ser vista por Herder não somente como meio produtivo para a recepção de literaturas estrangeiras, mas como instrumento expansor da língua e mesmo catalisador da formação da literatura alemã. Essa concepção esteve associada a um enfrentamento da noção classicizante de literatura – que entendia a antiguidade greco-romana como o berço da poesia – e a uma preocupação minuciosa com as especificidades do estrangeiro, as quais Herder agrupava sob o conceito de “tom” e que, numa dita “boa” tradução, é o que deveria ser preservado de modo a se conseguir ter uma imagem “fiel” desse outro em sua condição ímpar. Tal respeito pela especificidade do outro se evidencia na atividade tradutória de Herder e fundamenta seu entendimento de literatura, que viria a influenciar a posterior formulação goethiana de Weltliteratur.

 

Vozes do Romantismo alemão no pensamento sobre  tradução de Antoine Berman

Simone Petry (Doutoranda em História e Teoria Literária – UNICAMP/Fapesp), orientador: Marcos Antonio Siscar

 

Este trabalho apresenta preliminarmente o projeto de pesquisa A tradução como obra: relações entre a leitura Bermaniana do conceito romântico de obra de arte e sua reflexão sobre tradução, que tem como objetivo geral estudar a noção de tradução como obra, nos termos em que essa noção é desenvolvida no contexto da obra crítica e teórica do pensador francês Antoine Berman, dando-se ênfase à discussão de seus pressupostos, em especial no que diz respeito à manifestação de uma visão particular da crítica e da obra de arte tributária de sua leitura e compreensão do ideário romântico alemão. Buscaremos explicitar, portanto, o quanto o pensamento Bermaniano é tributário de seu modo particular de leitura do referencial romântico alemão, mas, também, o quanto sua reflexão impacta na construção de uma compreensão contemporânea da tradução. Desse modo, acreditamos aproximar a obra crítica e teórica de Berman de questões contemporâneas que, para além do campo disciplinar dos Estudos da Tradução, são candentes também no âmbito da crítica, da história e da teoria literárias, especialmente na medida em que estas também se revelam tributárias de alguma forma de leitura desse mesmo referencial romântico.

 

Tradução, relação e alteridade: questões de recepção do pensamento de Schleiermacher, Berman e Venuti

Letícia França (Mestranda em Letras: Estudos da Tradução – UFPR/CAPES), orientador: Mauricio Mendonça Cardozo

 

Friedrich Schleiermacher, Antoine Berman e Lawrence Venuti são nomes inequívocos no estudo contemporâneo de tradução. Uma constante no pensamento tradutório desses três pensadores permite uma aproximação de suas ideias: a defesa de um método de tradução que tem como objetivo revelar a diferença entre texto traduzido e texto original, entre estrangeiro e doméstico, entre o Outro e o Próprio. Porém, as reflexões empreendidas pelos três teóricos vão muito além de uma simples defesa de estratégias específicas para a prática da tradução, colocando em questão a própria natureza da relação que tem seu espaço no âmbito da tradução. Dessa forma, uma investigação sobre a maneira como as ideias desses três pensadores vêm sendo recebidas no país pode nos revelar novas possibilidades de leitura de sua obra: para além das discussões acerca da prática e crítica de tradução, pelas quais são mais conhecidos no meio acadêmico, pode-se empreender uma reflexão sobre o pensamento de Schleiermacher, Berman e Venuti que problematiza a prática de tradução a partir do viés relacional aqui proposto. Este trabalho, resultado da pesquisa de Iniciação Científica de mesmo título e vinculada ao projeto de pesquisa “Tradução como poiesis da relação: a questão do outro em tradução”, busca justamente identificar essas tendências de recepção do pensamento dos três teóricos, avaliando a maneira como essa questão relacional é explorada (ou não é explorada) na pesquisa na área dos Estudos da Tradução realizada no país, além de flagrar os diferentes movimentos possíveis de crítica e aplicação das ideias defendidas por Schleiermacher, Berman e Venuti empreendidos pelos pesquisadores brasileiros. 

 

Witkacy e Sarah Kane: (des)encontros e(m) tradução

Luciano Ramos Mendes (Bacharelando em Letras Polonês – UFPR), orientador: Marcelo Paiva de Souza

 

A obra dramatúrgica do polonês Stanisław Ignacy Witkiewicz (1885-1939), também conhecido como Witkacy, almejava – de acordo com os princípios teóricos defendidos pelo autor, que concebia o teatro como “pura forma” – levar leitor e espectador a uma “experiência metafísica”. Alguns procedimentos de que lançava mão, em especial o uso dramático do choque e da violência, parecem compartilhar terreno comum com poéticas teatrais mais recentes, como é o caso por exemplo do “in-yer-face” da dramaturga inglesa Sarah Kane (1971-1999). Mediante a aproximação de ambos os autores, busco analisar seus textos dramáticos e sua linguagem teatral, bem como refletir sobre estratégias tradutórias que lhes possam fazer jus, tanto de um ponto de vista literário, quanto do ponto de vista das dinâmicas da cena contemporânea.

 

Exagero para além das fronteiras: a recepção de Thomas Bernhard

Yuri Kulisky (Bacharelando em Letras Português-Alemão: Estudos da Tradução – UFPR), orientadora: Ruth Bohunovsky

 

Como um polemista e provocador, predisposto ao ataque ácido e mordaz, veio a ser um dos principais nomes da literatura de língua alemã? Qual a problemática da atuação pública deste mau comportado autor na relação com a impertinência de seus escritos, em tudo aquilo que trazem à superfície? Pretendo discutir alguns momentos da relação das personas de Bernhard, geradas via tradução, com sua figura pública e literária na Áustria, atendo-me ao traço performativo e cômico de sua obra. O que uma voz tão perturbadora abala, transitando entre as fronteiras? Por fim, analiso brevemente o estado de sua recepção (e da construção de sua persona) no Brasil, através de traduções.

 

TRADUTOR E TRADUÇÃO: CONSTRUÇÕES IDEOLÓGICO-DISCURSIVAS

 

Tradução e Discurso: o tradutor e seu ofício no âmbito administrativo universitário

Giovana Cordeiro Campos de MELLO  (UFRJ)

Beatriz Fernandes CALDAS  (UERJ)

 

O mercado de trabalho da tradução vem se diversificando e se especializando cada vez mais.  Além das oportunidades para a atuação como tradutores e/ou intérpretes em editoras, empresas de tradução, dublagem e legendagem, entre outras, atualmente o mercado de trabalho brasileiro oferece vagas também no segmento das áreas administrativas de universidades públicas. A partir de um levantamento inicial, desde 2008 até meados de 2012 foram realizados pelo menos doze concursos públicos para provimento de vagas para tradutores e intérpretes em universidades públicas brasileiras, geralmente para atuação no campo de Relações Internacionais. Este estudo apresenta uma reflexão sobre o papel do tradutor e sua prática a partir da análise dos enunciados descritivos das tarefas atribuídas ao tradutor/intérprete nos editais públicos recolhidos. A partir da análise de discursos postos em circulação nesses editais, procura-se mostrar as significativas divergências existentes entre o discurso acadêmico, o qual reconhece a complexidade da atividade tradutória, e o discurso mercadológico, o qual repete construções ideológico-discursivas que deixam de considerar a constituição sócio-histórica e político-ideológica da atividade tradutória. O referencial teórico-metodológico utilizado foi o da Análise do Discurso francesa (AD) tal como concebido por Michel Pêcheux ([1975] 1988) e em construções teóricas brasileiras afiliadas. A partir das multiplicidades de sentidos que deslizam em torno dos enunciados elegidos para análise, são apresentadas considerações a respeito do perfil do sujeito-tradutor e sua tarefa no âmbito administrativo universitário, as quais remetem à historicidade da atividade tradutória no Brasil.

 

A tradução como instigação

Lenita Esteves (USP)

 

Este trabalho faz parte de minha tese de livre-docência, que analisa instâncias de tradução à luz da Teoria dos Atos de Fala, como proposta por J. L. Austin. A tese propõe uma divisão em famílias de atos de fala, e no caso específico deste trabalho a família é a dos atos de tradução como intervenção política. Os casos analisados aqui se filiam à subfamília da “tradução como instigação”. O primeiro é o “heroico” episódio da intérprete de língua de sinais na eclosão da Revolução Laranja, na Ucrânia, e o segundo é o estudo feito por Maria Tymoczko a respeito da Irlanda.

 

14 de dezembro

 

SUJEITO DO DESEJO E TRADUÇÃO

 

Traços do desejo em dois tempos, dois movimentos

Márcia Atálla Pietroluongo (UFRJ)

 

Verdade, Sujeito, Desejo e Projeto são aqui palavras norteadoras sobre as quais se busca refletir, partindo-se da premissa de que a primeira tarefa dada a um sujeito que almeja levar sua vida às consequências últimas de seu sonho é a de traduzir-se. Eclodindo da pulsão de traduzir (BERMAN, 1995: 74), a história de um sujeito que advém pela palavra vai se escrevendo, mediada pelo estrangeiro de si mesmo e pelo impulso de afirmar o sentido de uma vida movida pelo desejo de letra, aí circunscritos também seus silêncios. Nessa história que tem como pano de fundo o projeto de tradução e a tradução como projeto dois tempos se delineiam, um já percorrido de onde se podem depreender certos traços de subjetividade, marcados pelas escolhas que se fizeram atos, e um devir que já se afirma em sua diferença.

 

Tradução-transmissão: inconsciente, estilo e precisão conceitual

Viviane Veras (Unicamp)

 

O sacrifício do estilo ao rigor conceitual emerge de forma especial nas traduções de textos de Freud: o problema do tradutor estaria na ligação entre palavras de uso cotidiano e terminologia científica, que um glossário comentado resolveria. Enfim, o estilo, ornamento, vestimenta, seria tão somente um obstáculo a ser eliminado, uma vez que vem turvar a transparência dos conceitos. Esse gesto de desconfiança com relação aos equívocos e às imprecisões da linguagem, que conduz à tentativa de redução da análise do estilo a mera literatura, presume essa transparência, quando deveria, antes, procurar demonstrá-la. Consideramos que aquilo que parece descartado rápido demais é o jogo de forças entre o vocabulário teórico e essa linguagem comum, e que talvez seja mais ‘freudiano’ pensar a tradução-transmissão da psicanálise nessa língua de Freud como algo que em sua obra mantém a tensão constante entre o deixar levar-se pelo objeto de estudo e a tentativa de dominá-lo, acomodando os desvios e as interrupções.

 

TRADUÇÃO, SILÊNCIO E ALTERIDADE

 

A tradução e o (silencioso) devir das formas de vida 

Helena Franco Martins (PUC-Rio/CNPq)

 

Disse Blanchot certa vez que a tradução “realiza o devir das línguas – e o traduz”. Em face de tudo o que se tem dito sobre as potências e virtudes da chamada “tradução estrangeirizante”, parece imediatamente compreensível a ideia de que a atividade tradutória tem a capacidade virtual de realizar o devir das línguas, de abri-las para o que acena com promessas de alteridade. Mas o que significa dizer que a tradução traduz esse devir? Este trabalho reflete sobre essa pergunta. Busca fazê-lo pensando as línguas como formas de vida que amalgamam Weltbilder, proto-imagens voláteis do mundo que, refratárias à intelecção e ao discurso, não se deixam propriamente converter em Weltanschauungen, visões do mundo. Explora-se a hipótese de que, ao reconhecer na tradução a virtude de traduzir o devir das línguas, Blanchot associa essa prática à possibilidade de um acercamento precário desse silêncio que, segundo suas provocativas e muito exatas palavras, só conhecemos “de ouvir falar”.

 

Na calada do outro: silêncio, mistério e o outro em tradução

Mauricio Mendonça Cardozo (UFPR/CNPq)

 

Em geral, ainda que de modo legítimo e plenamente justificável, a pesquisa em nossa área parece voltar-se mais para os domínios da possibilidade do dito do que para a discussão daquilo que se assume como uma forma de silêncio na tradução. Para abordagens – ditas mais científicas, instrumentais, pragmáticas, funcionais?… muitos são seus nomes – fundadas no imperativo da solução de problemas, aquilo que silencia na tradução, não raro, muito se aproxima daquilo que, na tradução, falha. E, nos domínios de uma lógica pautada mais centralmente pelo que, na tradução, funciona – encontra solução –, o que falha passa a ocupar um lugar à margem do que interessa dominantemente: quando muito, torna-se dado ou ocasião útil para a identificação dos limites de determinado modelo ou estratégia. Partindo de reflexões do campo da teoria literária e da filosofia contemporânea, para as quais interessa discutir o silêncio também como traço constitutivo da alteridade, este trabalho propõe-se a pensar um possível redimensionamento da questão do silêncio na tradução.

 

 

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